18 de set. de 2013

Mudança

Sente-se em outra cadeira, no outro lado da mesa. Mais tarde, mude de mesa.
Quando sair, procure andar pelo outro lado da rua. Depois, mude de caminho, ande por outras ruas, calmamente, observando com atenção os lugares por onde você passa.
Tome outros ônibus.
Mude por uns tempos o estilo das roupas. Dê os seus sapatos velhos. Procure andar descalço alguns dias. Tire uma tarde inteira para passear livremente na praia, ou no parque, e ouvir o canto dos passarinhos.
Veja o mundo de outras perspectivas.
Abra e feche as gavetas e portas com a mão esquerda. Durma no outro lado da cama... Depois, procure dormir em outras camas. Assista a outros programas de tv, compre outros jornais... leia outros livros.
Viva outros romances.
Não faça do hábito um estilo de vida. Ame a novidade. Durma mais tarde. Durma mais cedo.
Aprenda uma palavra nova por dia numa outra língua.
Corrija a postura.
Coma um pouco menos, escolha comidas diferentes, novos temperos, novas cores, novas delícias.
Tente o novo todo dia. O novo lado, o novo método, o novo sabor, o novo jeito, o novo prazer, o novo amor.
A nova vida. Tente. Busque novos amigos. Tente novos amores. Faça novas relações.
Almoce em outros locais, vá a outros restaurantes, tome outro tipo de bebida, compre pão em outra padaria.
Almoce mais cedo, jante mais tarde ou vice-versa.
Escolha outro mercado... outra marca de sabonete, outro creme dental... Tome banho em novos horários.
Use canetas de outras cores. Vá passear em outros lugares.
Ame muito, cada vez mais, de modos diferentes.
Troque de bolsa, de carteira, de malas, troque de carro, compre novos óculos, escreva outras poesias.
Jogue os velhos relógios, quebre delicadamente esses horrorosos despertadores.
Abra conta em outro banco. Vá a outros cinemas, outros cabeleireiros, outros teatros, visite novos museus.
Mude.
Lembre-se de que a Vida é uma só. E pense seriamente em arrumar um outro emprego, uma nova ocupação, um trabalho mais light, mais prazeroso, mais digno, mais humano.
Se você não encontrar razões para ser livre, invente-as. Seja criativo.
E aproveite para fazer uma viagem despretensiosa, longa, se possível sem destino. Experimente coisas novas. Troque novamente. Mude, de novo. Experimente outra vez.
Você certamente conhecerá coisas melhores e coisas piores do que as já conhecidas, mas não é isso o que importa.
O mais importante é a mudança, o movimento, o dinamismo, a energia. Só o que está morto não muda !
Repito por pura alegria de viver: a salvação é pelo risco, sem o qual a vida não
vale a pena!


Clarisse Lispector

8 de set. de 2013

Uma festa

 A música estava tocando alta,agitada,fazendo todos dançarem,menos eu. Mas meu desgosto pela dança não vem a caso agora.
 Eu estive olhando para ele a noite toda. Uma hora,ele parou de dançar,e foi falar comigo. Ele se sentou na minha mesa. Me sentia tensa,nervosa,ansiosa. Precisei colocar minhas mãos entre os joelhos para que elas parassem de tremer. 



 O cheiro do álcool se espalhava pelo ar,me dando dor de cabeça. Ele segurou minha mão com cuidado. Seu bafo era quente,mas também tinha um pouco de álcool. Sua voz era rouca,e ele perguntou meu nome.
- Ga- Gabriella... - aquele garoto me fazia esquecer meu próprio nome: isso não era justo. Ele me disse seu nome,mas eu já sabia.
- Você é linda,sabia? Eu estive olhando pra você a noite toda. 



 "Não esteve não" pensei "eu com certeza saberia."
- Fica comigo? - perguntou ele,colocando sua boca mais perto do meu rosto. Eu podia sentir seu bafo quente nas minhas bochechas que,àquela altura,deveriam estar vermelhas.
 Eu pensei um pouco. Aquele garoto me dava medo,mas me deixava segura. Medo. Álcool. Mentiras. Melhor não.
 - Eu... Não.
 - É... Por quê? - disse ele,se afastando um pouco,olhando nos meu olhos.
 - Porque... bem,eu não sei. - respondi,com lágrimas se formando nos meu olhos.
 Depois disso,fiquei surpresa. Ele disse que poderíamos ser amigos,que estava tudo bem. "Ter outra oportunidade". Então,ele me abraçou. Foi um abraço quente,demorado. Demorado demais. Bom demais. Não queria soltá-lo,e parecia que ele também não. 


Agora está tudo no passado. Não posso mudar. E me arrependo muito de ter tido tanto... Medo.


Cdt fotos: REPRODUÇÃO
História fictícia.